A onipresente arquitetura ARM

- por Sergio Prado

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Eu carrego um ARM no meu bolso todo dia. É o Milestone, um smartphone da Motorola com Android. Na minha bolsa, também carrego outro ARM, o Kindle, e-book reader da Amazon. Se eu continuar com o que tenho em casa, pode ser que a lista fique um pouco longa.

Mas porque a arquitetura ARM é normalmente a escolha quando falamos em equipamentos portáteis e móveis? O passado talvez possa explicar um pouco a onipresença dos chips ARM nestes dispositivos.

ORIGEM

Era uma vez uma empresa chamada Acorn Computers Ltd, fabricante de computadores na Inglaterra, que fez sucesso no inicio da década de 80, fabricando um microcomputador para a rede televisiva BBC. Chamado de BBC Micro, este PC foi concebido para um programa de educação, e vendeu quase 2 milhões de unidades. Usava um 6502, processador de 8 bits fabricado pela Rockwell, com endereçamento de 16 bits e rodando normalmente a 1MHz. Essa foi a mesma CPU usada nos famosos Apple I e Apple II, e suas variantes também foram usadas em videogames como o Atari 2600 e o NES da Nintendo.

Quando sentiram a necessidade de um chip com maior capacidade de processamento, os engenheiros da Acorn não encontraram uma CPU de 16 ou 32 bits no mercado que pudesse satisfazer estas necessidades, então resolveram criar uma CPU do zero. Em 1985, nasce o primeiro chip ARM.

OS PRIMEIROS PASSOS

Os engenheiros da Acorn focaram no desenvolvimento de um chip low-end, com poucos recursos mas com boa performance. Enquanto que a Acorn projetava o chip, quem fabricava era outra empresa, a VLSI Technology.

O ARM1 nasceu como um RISC de 32 bits, baseado na arquitetura do 6502, e foi usado basicamente como coprocessador no BBC Micro. O ARM2 apareceu um ano depois, com melhorias no conjunto de instruções, principalmente para deixar mais rápidas as instruções hoje comuns em DSPs, como operações de multiplicação.

Em 1987 a Acorn lança o Archimedes, seu primeiro computador pessoal com um chip ARM, que fez bastante sucesso principalmente na Inglaterra, mas que acabou perdendo mercado para os PCs x86 (IBM-compatible) e sua gigante base de software já instalada.

O relativo fracasso do Archimedes não desestimulou a equipe da Acorn a continuar o desenvolvimento de melhorias na arquitetura. Enquanto que nas duas primeiras versões o objetivo era ter um chip com performance aceitável para computadores pessoais, a próxima versão deveria ter o tipo de performance esperada para computação mais pesada. Em 1989 a Acorn lança o ARM3 com um cache de 4K e clock rodando a 25MHz.

ACORDO COM A MAÇÃ MAIS FAMOSA DO MUNDO

Nesta época, já estava bem claro para o mercado as características do chip ARM e de seu nicho de mercado: RISC de alta performance, baixo consumo e excelente custo/benefício, voltado para uso em sistemas embarcados.

E a famosa empresa da maçã percebeu isso. Em condições bem “secretas”, um acordo foi feito entre a Acorn, a VLSI Technology Inc e a Apple. Uma nova empresa foi fundada, a Advanced RISC Machines Ltd, joint venture entre estas três empresas. Os principais designers do chip saíram da Acorn e se juntaram à equipe da nova empresa (que agora tinha a ajuda e a força da Apple).

Seu objetivo era dar continuidade ao desenvolvimento da arquitetura ARM, e seu modelo de negócios mudou para o que conhecemos hoje, a venda de licenças da arquitetura ARM. Consequentemente, a VLSI Technology foi a primeira a licenciar o chip, que os produzia para a Acorn fabricar seus computadores pessoais. A Apple tinha interesse em usar a arquitetura ARM em seus futuros computadores de mão.

DEFINIÇÃO DO MERCADO

O interesse da Apple na empresa ajudou a criar uma marca forte para a ARM, e levou à estratégias de market como a mensagem “ARM-powered” estampada nos equipamentos com o chip.

O ARM6 foi o primeiro design da nova empresa, no começo de 1992, cujo objetivo principal foi ter uma CPU para a Apple desenvolver sua linha de PDAs chamada Newton. A ARM também trabalhou forte para disponibilizar ferramentas como compiladores assemblers e emuladores para disseminar o uso da arquitetura.

Algumas empresas começaram a licenciar a arquitetura ARM. A já extinta DEC licenciou a arquitetura e lançou o microprocessador StrongARM, rodando a 233MHz com apenas 1W de consumo. Até a Intel licenciou a arquitetura para o desenvolvimento do XScale.

A ARM entrava de vez no mercado de sistemas embarcados.

UMA GRANDE FAMÍLIA

Desde então, a ARM têm desenvolvido um conjunto de processadores para abranger diferentes necessidades do mercado, de aplicações básicas com sensores e atuadores, a sistemas de tempo-real e dispositivos móveis como smartphones e netbooks.

A arquitetura ARM7 foi o divisor de águas para a entrada da ARM no mundo digital. O conjunto de instruções Thumb, introduzido em 1994 com o ARM7TDMI, foi um dos fatores de sucesso da arquitetura ARM, que possibilitou a economia de bastante memória e seu uso em dispositivos com poucos recursos. Apesar de termos ainda muitos devices com este core funcionando por aí, seu uso foi substituído pelos mais novos Cortex-M0 e Cortex-M3. Este último é uma versão melhorada do ARM7, suportando apenas o novo conjunto de instruções Thumb-2. Já o Cortex-M0 é uma versão reduzida do próprio Cortex-M3. Que tal substituir pelo mesmo preço o velho PIC por um ARM Cortex-M0? :)

A arquitetura ARM9 é voltada para aplicações mais pesadas em termos de processamento, como dispositivos de consumo, equipamentos de rede e sistemas automotivos (é a CPU usada no kit FriendlyARM mini2440). A família ARM11 adiciona um pouco mais de robustez ao core da CPU, e equipa os principais smartphones da atualidade. Estas arquiteturas devem ser substituídas gradativamente pela família Cortex-A. 

Vale ainda a menção do Cortex-R4, voltado para soluções com necessidades específicas de sistemas de tempo real.

Como se já não bastasse a quantidade de núcleos ARM disponíveis, e para “facilitar” ainda mais a nossa vida na hora de escolher uma CPU, existem dezenas de fabricantes ARM licenciados, com seus microcontroladores, SOC’s (System-On-Chip) ou ASIC’s (Application Specific Integrated Circuit), cheio de opções de periféricos e diferentes capacidades de memória. É muito fácil se perder neste mundo.

E O FUTURO?

Hoje a arquitetura ARM é unanimidade em dispositivos portáteis. Além de estar em 99,9% dos atuais smartphones, é usado em e-book readers (Kindle), video-game portáteis (Nintendo DS e 3DS), players de mídia (toda a família de iPod’s), aparelhos de GPS, etc.

Ao contrário da Intel, que agora esta correndo atrás do prejuízo com sua arquitetura Atom para entrar no mercado de sistemas embarcados, a ARM vêm aos poucos “comendo pelas beiradas” para começar a ocupar um reinado que tem sido da Intel durante um bom tempo. Já apareceu em alguns netbooks rodando Linux. A Microsoft já anunciou que esta portando seu sistema operacional para ARM.

Com o novo Cortex-A15, a ARM deve entrar de vez no universo da computação pessoal. Só o tempo dirá se ela terá o mesmo sucesso. O que você acha?

Um abraço,

Sergio Prado

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